Friday, 08 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1313

O caso Julian Assange e a liberdade de imprensa em xeque

Foto: Cancilleria de Ecuador

Enquanto aguarda a retomada do julgamento de sua extradição, Julian Assange permanece na prisão de segurança máxima Belmarsh, em Londres. Já passaram 568 dias desde que o jornalista foi expulso da Embaixada do Equador e preso pela polícia britânica, em abril do ano passado. As audiências que ocorreram no mês de setembro terminaram inconclusivas após a decisão da juíza do caso, Vanessa Baraitser, de aguardar a passagem das eleições norte-americanas para continuar o processo. Assim, o pleito foi adiado para o dia 4 de janeiro de 2021. O australiano enfrenta há dez anos o assédio dos EUA por ter publicado no site WikiLeaks documentos que denunciavam crimes de guerra em regiões do Oriente Médio e da África.

Caso seja extraditado, Julian Assange poderá enfrentar o duro tribunal da Virgínia, nos EUA, cujo júri é famoso por ter ligações com a CIA. O jornalista tem 18 acusações e pode ser condenado a 175 anos de prisão. Das imputações contra ele, 17 estão associadas à Lei de Espionagem de 1917 da jurisdição estadunidense. O governo defende que, ao publicar informações secretas da inteligência do país, o australiano colocou em risco a segurança nacional. Apesar do aparato jurídico, organizações de todo o planeta se mobilizam para provar a ilegalidade da prisão de Assange e lutar pela liberdade do australiano.

Uma delas é a Lawyers for Assange (Advogados pela defesa de Assange), um grupo de juristas que acompanha independentemente todo o material e a repercussão do processo contra o jornalista. No dia 17 de agosto deste ano, a organização publicou um parecer jurídico no qual constata as violações do Direito Internacional e dos Direitos Humanos cometidas pelo Reino Unido. A carta foi enviada ao primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, ao ministro de Relações Interiores e Exteriores Anthony Eden e à presidente da Suprema Corte, Brenda Hale. Na carta, o grupo pede a liberação imediata de Assange e a finalização dos procedimentos contra ele. Mais de 60 políticos corroboraram o parecer legal.

Advogada brasileira em Londres e integrante da associação, Sara Vivacqua considera que a prisão de Assange e as acusações contra ele têm o poder de mudar a visão jurídica sobre a liberdade de imprensa no mundo. “O processo contra Julian Assange é flagrantemente ilegal, e vai decidir muitas coisas importantes se ele for extraditado. O Assange é australiano, nunca publicou nos EUA, então eles estariam atraindo a jurisdição mundial para si e poderiam, por consequência, indiciar qualquer outra pessoa que publique informações que considerem de segurança nacional, extraditar para os EUA e julgar no infame júri da espionagem [júri de Virgínia].”

Além disso, Sara acrescenta, o Reino Unido e os Estados Unidos conduzem a preservação da segurança nacional acima dos Direitos Humanos, já que nos documentos vazados pelo site WikiLeaks é possível encontrar dezenas de crimes do Exército americano cometidos no Iraque, no Afeganistão e na Líbia. “Estão colocando o segredo de Estado como um direito absoluto, não relativizável em nenhuma circunstância, nem se esses segredos contivessem crimes de guerra, tortura e violassem todos os tratados de Direito Internacional e Direitos Humanos.”

No Brasil, a condenação de Julian Assange também teria repercussão negativa, já que acirraria uma disputa já posta entre os veículos de mídia e o judiciário. Jornalista e professor do Departamento de Comunicação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-rio), Alexandre Henrique Caroli enxerga com preocupação uma possível condenação de Julian Assange. “É a abertura de um precedente perigoso. Se isso [a condenação] acontecer, será mais um elemento da escalada de uma visão e uma postura autoritária, muitas vezes não explícitas e incorporadas pelas instituições, inclusive pelos poderes legislativo e judiciário.” Caroli lembra, ainda, a perseguição a Glenn Greenwald no Brasil, depois da publicação de conversas entre o juiz Sergio Moro e os procuradores da Operação Lava Jato, movimentação que fere os princípios básicos de imparcialidade do magistrado. “No caso brasileiro, [a condenação de Assange] vai incentivar decisões nesse sentido”, conclui.

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Beatriz Aguiar é estudante de Jornalismo na PUC/Rio de Janeiro.